quarta-feira, 17 de junho de 2015

O Caipira Revisitado


Esse blog é como cachaça artesanal. É feito com muito carinho para a família e os mais chegados e o produtor não é um mega empresário. É um artista que se dividindo nas funções  de músico, professor, produtor de música e cachaça e pesquisador, de música e cachaça sim senhor, tenta manter viva a chama destes dois símbolos: A música Brasileira e a Cachaça. Estou devendo postagens sei disso, mas enquanto não atualizo com minha próprias palavras os pratos deste cardápio, compartilho esse texto do Edilson Chaves para a revista "Carta Fundamental". É um texto dirigido para professores abordando a possibilidade e necessidade de se trabalhar a cultura caipira em sala de aula. De qualquer forma é uma ótima apresentação de questões que precisam ser refletidas não apenas pelos pequenos de sala de aula (é uma revista direcionada a professores de ensino fundamental) mas na verdade por toda a nossa sociedade. Alem de tudo acaba sendo uma breve homenagem a grande Inesita Barroso. Se escutar é uma arte, ler é escutar com os olhos.

Por Edilson Chaves*
Uma das maiores pesquisadoras da música brasileira caipira do Brasil, Inezita Barroso, morta aos 90 anos em março de 2015, afirmava que, ao longo dos anos, a figura do caipira foi sendo desvalorizada e que seu resgate se nos filmes de Amácio Mazzaropi, por meio do seu personagem Jeca Tatu.  Embora nascida na capital paulista, Inezita dedicou toda sua vida às coisas do interior. Na infância, teve contato com o folclore brasileiro e tradições como Folia de Reis, a catira e o cururu. 
A exemplo dos Irmãos Jacob e Wilhelm Grimm, que no século XIX viajaram pelo interior da Alemanha recolhendo depoimentos sobre histórias camponesas, nas décadas de 50 e 60 do século XX a cantora e pesquisadora viajou pelo Brasil pesquisando, recolhendo relatos presenciais em documentos antigos e registrando contos populares. Dessa forma, tornou possível a preservação da memória da canção brasileira de raiz, com seus ritmos, melodias e letras, construindo um valioso mapa da música caipira e do folclore brasileiro. 
Uma das músicas gravada por ela e que se transformou em sucesso foi “Marvada Pinga”. Segundo Inezita, a música era de domínio público e possuía ao menos sete versões, outras fontes, porém apontam a composição como de Ochelsis Laureano. Para a pesquisadora, isso era a essência do caipira, ou seja, de tempos em tempos alguém ampliava ou modificava a letra da música conforme lhe convinha. 
“Leilão”, de Heckel Tavares e Joracy Camargo, outra música gravada por Inezita, possibilita um outro olhar sobre o passado brasileiro. A canção retrata cenas coloniais como a chegada dos africanos escravizados ao Brasil, destacando suas intensas lembranças da África e as condições de vida no cativeiro. A música, na voz de timbre tão característico de Inezita, em tom de melancolia, possibilita o enriquecimento da alma. Uma obra de arte. 
Inezita, por quase quatro décadas esteve à frente de um dos programas de maior audiência da TV brasileira, o “Viola, minha viola”. Esse sucesso pode ser tomado como evidência do espaço que a cultura caipira e em especial a música de raiz ocupam na cultura brasileira contemporânea. Deve-se destacar que o programa, além de sua função de entretenimento, tornou-se uma das maiores fontes para pesquisadores do gênero, por apresentar antigas e novas gerações de compositores e intérpretes que contribuíram e contribuem com a preservação da autêntica música caipira. 
Inezita afirmava sempre que o mundo caipira era um “mundo machista”, no entanto, outras mulheres tiveram o mesmo êxito que Inezita. É o caso das irmãs Mary e Marilene, conhecidas como “As Galvão” que completam, em 2015, 68 anos de carreira. A dupla, incentivada pelo pai, sofreu preconceito pelo resto da família. Começaram cantando ainda crianças mas o espaço no rádio que foi diminuindo na medida em que se tornavam adultas, por puro preconceito.
No universo caipira, abraçado muito cedo, somente elas e Inezita Barroso resistiram ao tempo, às imposições e ao machismo. Para provar que podiam competir na música caipira, aprenderam, além do violão e sanfona, a tocar viola e dançar catira. Nenhuma outra dupla feminina conseguiu tamanho sucesso. Foram pioneiras ao viajarem pelo interior do Brasil e a cantar em circos, espaço das duplas masculinas. Entre seus sucessos estão “Beijinho Doce (Nhô Pai)”, “Viola sem defeito”, de Athos Campos, e “No calor dos teus abraços” (Niceas Drumont/Cecilio Nena).
Música caipira: do que é que estamos falando 
Para se compreender a música caipira como elemento da cultura nacional é preciso relembrar que, na década de 1920, surgiram no Brasil estudos de resgate dessa cultura. A partir dessa década, surgiram as primeiras canções caipiras gravadas em disco, como a célebre “Tristeza do Jeca”, composta por Angelino de Oliveira em 1918 e gravada em 1923. 
Mas será com Cornélio Pires e sua Turma que esse gênero musical entrará na indústria cultural. O primeiro passou a se apresentar pelo interior paulista fazendo shows e gravando seu primeiro disco em 1929. Em 1931, tocou no Teatro Municipal de São Paulo alcançando o reconhecimento do público. Esse foi um período de transformação na história da música caipira, pois a partir daí as canções foram apropriadas pela indústria cultural e entraram para o universo da cultura de massa. 
Esse momento marca, portanto, a transição da música caipira composta e cantada pelo homem do campo para outra forma de expressão denominada de música sertaneja, feita na cidade pelo e para o migrante caipira urbanizado. Grandes mudanças passaram a ocorrer na composição das letras: as temáticas que antes tratavam de ritos religiosos, canções de trabalho, ciclos da lavoura, passam a tratar do amor, da nostalgia gerada pela perda do lugar e da cultura de origem. 
A cultura do campo é levada ao homem urbano através dos programas de rádio das grandes cidades, influenciando compositores urbanos como Noel Rosa (“Festa no Céu”, “Minha Viola”, “Mardade Cabocla”), Ary Barroso (“Rancho fundo”) e Lamartine Babo (“Serra da Boa Esperança”), que só mais tarde se tornariam sambistas. 
Mas, se o homem do campo foi para a cidade, a que classe passa a pertencer? Dada a grande migração a partir do período desenvolvimentista de 1950, esses homens passam a fazer parte de diferentes segmentos da classe operária, mas sem esquecer o passado e as origens, como expressa o fragmento da canção “Sodade do tempo véio”, de Sorocabinha, com Mandy e Sorocabinha, de 1939: “É só eu pega na viola, me vem a recordação: o tempo do meu sitinho, que tudo era bom, ai... que tudo era bom. (...) 
  Marcada por uma identidade própria, a música caipira enquanto linguagem expressa conteúdos (modos de pensar e compreender o mundo, de se divertir, de trabalhar, de se relacionar, de viver) de uma cultura que, ao longo da história, foi sendo definida como “subcultura”. Essa linguagem, porém, pode ser utilizada como formadora de um novo conceito a respeito da cultura caipira e do caipira, sendo capaz de destruir alguns mitos, de que se trata de uma “subcultura” da cultura brasileira. 
É relevante destacar algumas obras que contribuíram para a construção de uma representação do mundo do campo (agora chamado “caipira”), no período modernista. Enquanto a maioria dos fotógrafos, literatos e artistas plásticos da Belle Époque brasileira destacavam o desenvolvimento urbano e econômico do país – o que nos proporcionava a condição de “civilizados” – Monteiro Lobato (Urupês, 1918) e Paulo Prado (Retrato do Brasil, 1928) procuram desconstruir essa imagem do País europeizado e acabam mostrando as mazelas da sociedade brasileira. Como o lastro da economia do país, naquelas décadas, vinha sobretudo da agricultura e, em decorrência, havia grande concentração demográfica no espaço rural, ao criticar a mentalidade da elite agrário-exportadora do país, Lobato acabará criando um personagem caricatural do homem do campo, o Jeca Tatu, regenerado posteriormente com o Zé Brasil. 
Assim, desde o início do século XX, há uma vasta produção escrita e iconográfica que associa o campo a ideias de atraso e desqualificação (moral, intelectual, tecnológica). Essa representação negativa e pejorativa da vida e das pessoas do espaço rural permaneceu, e foi contra ela que Inezita Barroso lutou, trabalhando em prol da valorização de uma parte significativa das raízes da cultura brasileira, expressas na música e na cultura caipira.
Embora não seja produzida com finalidade pedagógica, a música caipira pode ser utilizada, pelos professores em aulas de História, Literatura, Geografia e Arte, por exemplo, como fonte a partir da qual os alunos podem se aproximar das formas culturais que identificam determinados grupos sociais, produtores de realidades sociais diversas. 
No caso específico da música caipira, que carrega, assim como outros gêneros, uma gama de metáforas e simbologias, é possível afirmar que pode auxiliar alunos e professores na construção do conhecimento, estimulando a capacidade de análise a partir de comparações de épocas e sociedades diferentes. Também pode contribuir para corrigir ideias preconceituosas naturalizadas ao longo da História brasileira, uma vez que coloca em pauta concepções, sentimentos e opiniões do caipira sobre diferentes temas da vida nacional e da vida humana, em geral, como o trabalho na cidade ou no campo, o amor, a guerra, o tempo e a natureza. 
Ouvir músicas que retratam temas como a mulher, a República, o malandro, o regenerado, a cidade ou o campo é um fato do cotidiano de muitas pessoas, mas nessa circunstância a audição tem finalidade em si mesma – ouve-se música porque se quer, porque se gosta, e não porque é uma fonte de reflexão sobre o tema em questão nas canções. Sabe-se, porém, da importância da música dentro da sociedade, sobretudo das canções que tratam de temáticas fundamentais e que ajudam a construir argumentos ou sentimentos sobre a forma como viveu ou vive um grupo social, uma sociedade. 
Carregadas de materiais simbólicos, contribuem para a compreensão de uma dada realidade e permitem a construção de novas leituras sobre ela. Uma canção pode auxiliar os ouvintes mais atentos a se situar dentro de um contexto histórico, construindo novos significados. Do ponto de vista do ensino, pode servir como fonte para a interpretação de fatos de um determinado tempo, criando argumentos que ajudam a desvendar imagens sobre um povo, sua vida, sua cultura. 
Ressalta-se, portanto, que a inclusão da música caipira nas aulas, pelos professores, poderia ser um valioso elemento para o trabalho de ensino interdisciplinar porque apresenta um caráter narrativo das dificuldades do homem rural na cidade grande, bem como a contraposição dos valores urbanos frente aos do sertão. Além disso, pela riqueza das temáticas abordadas, de forma narrativa, pode abrir inúmeras possibilidades de articulação com diferentes conteúdos escolares. 

*Historiador, é doutor em educação pela UFPR e professor do Instituto Federal do Paraná
http://www.cartafundamental.com.br/single/show/394


quarta-feira, 29 de outubro de 2014

A Minas de Andrelândia/ Me Leva


Há muito tempo ouvia falar de Andrelândia. Lindalva e Paulo além de tios de Jaqueline são verdadeiros embaixadores desta cidade. Jaqueline sempre trouxe lembranças infantis de mesas fartas, queijos, pães (pães de queijo), biscoitos e do mel. Com tanta mineiriçe para conhecer rumamos pra lá.
O caminho não é tão desconhecido. Fomos por Volta Redonda e no percurso cidades como Santa Rita do Zaru ou mesmo o acesso a Santa Rita do Jacutinga e Rio Preto (depois de Valença-RJ) nos mostram a proximidade do sul fluminense com Minas, na paisagem, no sotaque e nos sabores.
Andrelândia é uma típica cidade do interior de Minas. Uma igreja da Matriz, uma igreja de Nossa Senhora do Rosário, uma praça com alguns cachorros soltos, pequenos bares, cerveja gelada, preço honesto, gente acolhedora e tranquilidade. Tudo isto com direito à um Cristo Redentor no ponto mais alto da cidade. Não deu nem para sentir saudade do Rio (principalmente pelo calor que fazia naquele fim de semana no Rio).

Para se sentir em casa

No universo da cachaça Andrelândia é discreta e autêntica como um bom mineiro. A cachaça mais conhecida é a “Serra Azul” que é muito bem distribuída nos principais pontos de venda da cidade. Fomos ao principal supermercado de Andrelândia e lá encontramos a “Serra Azul” na entrada do estabelecimento. Além das garrafas de 700ml, nas versões prata e carvalho, encontramos duas versões que chamaram atenção: uma em garrafa pet de 250ml com rótulo de Serra Azul, chamada de meiotinha, a outra uma versão em garrafa pet de dois litros sem rótulo, mas de mesma origem. Esta última se achava tanto na gôndola do supermercado quanto em um Stand da própria Serra Azul. A de dois litros, mesmo sem rótulo, tinha todas as informações estampadas em um laudo laboratorial onde além das informações básicas de graduação alcoólica e procedência, possuía também as informações técnicas de acidez volátil, índice de cobre, compostos secundários, aldeídos, entre outros.


A meiotinha
Stand da Serra Azul em supermercado local

Geralmente não se recomenda a aquisição e consumo de cachaças sem rótulo, mas, nesse caso, além de sabermos a procedência, tínhamos muito mais informações que o habitual. O laudo laboratorial exposto ao lado do produto no supermercado dava confiabilidade àquela cachaça. Esta prática pode ser uma alternativa local aos custosos procedimentos de registro da cachaça junto ao MAPA. Lembro que este registro é condição legal para comercialização do produto. 


Laudo laboratorial Serra Azul
Outro elemento interessante da cultura dos andrelandenses que me identifiquei foi o fato deles beberem cerveja acompanhada da "meiotinha”, a pequena garrafa de 250 ml que custa R$5,00 nos bares (preço de uma única dose em uma cidade como o Rio de Janeiro).  Cinco doses de 50 ml pelo preço de uma! Em tempos de vodcas de péssima qualidade habitarem as mesas de bar em cidades do interior, esta acaba sendo uma forma de prestigiar o produto local. 
O exemplo da meiotinha serve ainda para relativizar a imagem que temos do uso de garrafas pets para o armazenamento de cachaças. Considerando que o álcool é corrosivo e, justamente por isso, é tradicionalmente vendido em embalagens de vidro, o setor de bebidas tem desenvolvido embalagens plásticas para armazenamento de cachaças por períodos curtos, como no caso da meiotinha.
Paulo, nosso anfitrião, fez questão de nos levar ao alambique de outra cachaça produzida pela pousada dos Querubins: "Me Leva" Chegando lá fomos muito bem atendidos por um simpático e atencioso senhor que minha péssima memória não registrou o nome.  Este senhor nos apresentou o alambique que, segundo ele, já possui tradição na produção, mas que fora movido de outra localidade. Ainda assim preservam o mesmo rótulo que possui o design e nome de rótulos antigos. 
Cachaça Me Leva
No fim do dia, as escuras nuvens se transformam em chuva forte de lavar os cantos da rua de pedra. A informação de que Andrelândia é campeã de incidência de raios (mais que  a famosa vizinha Ibitipoca) nos prende em casa para um café e um baralho intercalado por roncos de trovão. Lembrei  das épicas chuvas de janeiro nas férias de infância no interior do Maranhão. Passada a chuva, a vez da passarada anunciando o dia de sol seguinte.  
Sol, chuva, pingos e pingas, comida e gente amiga. Andrelândia é  para voltar. Agradecimentos à Família do Paulo (irmãos e mãe), Jorge Lucas, Nathalia, Nicolas, Lindalva e Jaqueline.

Rádio histórico da família Almeida
  

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Uma Nova Cachaça

Ouve o canto gauchesco e brasileiro




Já tem tempo que quando me perguntam de onde vêm as melhores cachaças do Brasil titubeio. Sou carioca e o estado do Rio de Janeiro têm despontado nos últimos concursos com cachaças de excelência. Temos a tradição de Paraty, os alambiques do Vale do Paraíba cada vez mais preocupados com a qualidade e o retorno de cidades como Quissamã no norte fluminense apresentando novos horizontes para o cenário atual.
  Minas está bem aqui e realmente não dá para competir quando se fala em quantidade e qualidade (no caso da cachaça de alambique). Se você quer enveredar pelo mundo da produção da cachaça, se verá procurando absolutamente tudo em Minas. De um simples alcoômetro à um filtro de resina Cátion- íon (para redução de cobre) tudo referente à cadeia produtiva vêm das Minas. É fato que o tamanho do estado e a diversidade da produção faz com que nem tudo que vêm das minas seja ouro em se tratando de cachaça. Isto acontece por conta da realidade de um estado que construiu uma linda história com a cachaça e possui produtores de todos os tipos: do milionário, ao “caseiro” (mais que artesanal).
  O brejo paraibano é outra referência, principalmente para os amantes da cachaça branca, pura e com gosto de cana, não dá para não remeter à “Volúpia” ou “Serra Limpa”. Se continuarmos no nordeste então a questão continua complicada pois uma cachaça como a “Serra das Almas” prata representa brilhantemente a  chapada diamantina na Bahia e não pode ser esquecida. Ainda no nordeste cachaças como a “Engenho Água Doce” de Vicência- PE nos mostram que tem muita coisa boa por lá que não chega por nossas bandas (sudeste).
  De todos os estados que têm retomado a sua produção de cachaça o que mais têm chamado atenção pela qualidade e diferenciação dos produtos é o Rio Grande do Sul. A experiência dos sulistas no ramo das bebidas remete ao vinho, mas na cachaça o que temos percebido é que a união, organização, produção assessorada e o uso de novas técnicas têm feito com que a cachaça adquira novas referências gustativas e olfativas muito além da lembrança da matéria prima.
  No último mês de abril tive a oportunidade de conhecer este belíssimo estado e visitar dois alambiques que representam muito bem esta “nova cachaça” que considero a cachaça do Rio Grande do Sul.

A Cachaça de Harmonia



Na “Harmonie Schnapps” tive um longo bate papo com o Leandro Hilgert que nos recebeu acolhedoramente em uma manhã de sábado de aleluia. Conversamos sobre sua história, sua relação com as novas e antigas tecnologias que vão da utilização de leveduras selecionadas à preservação do modelo de seu destilador (tipo Charantês). Leandro se mostrou um defensor da agricultura familiar e um pouco desta conversa pode ser conferido nestes vídeos que seguem:




  Esta cachaça têm conquistado seu espaço no mercado graças ao empenho e seriedade de seu produtor e da APRODECANA/ Alambiques Gaúchos. Recomendo a quem puder a aquisição tanto da prata por suas características singulares, quanto da envelhecida por se tratar de raro blend harmônico de quatro madeiras.





Casa Bucco



  Na Casa Bucco pudemos conversar com o Moacyr Menegotto e sua esposa. Moacyr nos contou sua experiência no mercado de bebidas alcoólicas demonstrando total conhecimento da área química da produção e preocupação em aplicar novos procedimentos à produção da cachaça, dentre eles: o uso de leveduras selecionadas.

 Moacyr foi a primeira pessoa com quem conversei sobre processos fermentativos que questionou com veemência a utilização do milho. Na verdade não se trata de uma censura, mas segundo ele, o milho geraria características no flavour da cachaça, que não permitiriam perceber nuances de “acabamento”, sutilezas que vão além da referência da matéria prima e pelo  que percebe-se em seu produto, o que o Moacyr quer é oferecer um diferencial que surpreenda até mesmo experientes degustadores.
  Depois de sua explanação, foi surpreendente perceber notas de ananás ou abacaxi em conserva de sua cachaça branca.
 Apresentadas as cachaças, feitas as explicações perguntei ao Moacyr:
  “Moacyr, ótima sua cachaça mas será que o grande público está procurando uma cachaça com tanta diferenciação? Uma cachaça que tenha informações tão rebuscadas sensorialmente?”
  Ao que ele responde:
  “Acho que não, mas como produtor você precisa saber o que está procurando, e eu sei.”
Muito bom poder conversar com um especialista que demonstrou carinho e cuidado em sua produção. Chamo atenção ao fato de também utilizar um equipamento do tipo Charantês que segundo ele cobra oito horas para a primeira alambicada.
Moacyr Menegotto
Destilador tipo "Charantês"

 Infelizmente não darei conta de falar da “Bento Albino” prata que é simplesmente impressionante. Não darei conta de falar da especialíssima “Flor do Vale” de castanheira ou da já difícil “Dom Braga”, “Velho alambique”...
  Cabe apontar que o que temos visto é que a estética da cachaça gaúcha difere bastante das demais do país. A referência da cana (bagaço, melado, rapadura) deixa de ser a única para agregar um rico mundo de sabores e aromas que acreditávamos só ser possível nas bebidas fermentadas. Este é o lado mais interessante.
  Nesta última semana recebemos a notícia de que a Weber Haus comprou a marca “Velho Pescador”, um ícone da cachaça gaúcha. Orgulhei-me de saber que um produto brasileiro continuou nas mãos de seu povo. Quem dera todo alambique que fecha, pudesse ter uma “fada madrinha” como os Weber para alimentar o sonho. Lembrei saudoso da Cachaça Minuca de Bananal- SP que tanto enriqueceu o mundo da cachaça com sua mágica "Peroba do Campo".
Parabéns Weber Haus pela iniciativa e por mostrar que além do chimarrão e do vinho o gaúcho também têm na Cachaça um símbolo de sua terra.

Fica a dica para as demais regiões produtoras do país:
   “...Ouve o canto gauchesco e brasileiro...”
Agradecimentos:

  Fernando Porto pelas dicas, Jaqueline Ferreira pelas imagens e Sr Luiz Anselmo pela companhia. Leandro Hilgert da “Harmonie Schapps” e Moacyr Menegotto da “Casa Bucco” pelo acolhimento.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

"O Tio Sam está querendo conhecer a nossa batucada"


Revelia ( Onde está o Luiz Potter?)
  Em abril de 2013 tive a oportunidade de excursionar pelos Estados Unidos com a Orquestra Revelia que fora convidada pela  universidade de Louisville- KY a fazer palestras sobre música brasileira a partir de nosso primeiro cd : “Músicas para Saudar Jorge Amado”. Este trabalho gravado no ano de comemoração, póstuma, do centenário do autor (2012)- evidencia o universo baiano e o parentesco deste com gêneros de matriz africana relacionados principalmente  ao Candomblé.

     A universidade de Louisville
  Existe um programa de intercâmbio da Universidade de Louisville com algumas universidades brasileiras como a universidade de Brasília e a USP. A universidade possui um programa de pós-graduação em performance de Jazz, o que atrai estudantes de vários países. É importante mencionar que como fruto desta parceria, a universidade conta com um grupo de música brasileira, o Brazil Ensemble.
Segue um trecho de workshop na universidade.


 Os sabores (Tão Perto tão longe)
  A ida à Kentucky remeteu automaticamente ao famoso frango do coronel Sanders (KFC- Kentucky Fried Chicken) e aos  Bourbons. Kentucky é a terra dos Bourbons junto com outros estados como o Tenesse.  

  Infelizmente não pudemos visitar nenhuma destilaria. O cronograma apertado não permitiria um luxo desses que nos tomaria um dia inteiro, sobretudo porque tínhamos o compromisso das apresentações. Ainda assim pude degustar alguns e confesso que gostei.

  O Bourbon
  Não sou um bebedor de Uísque, diria até que não coloco esta entre minhas bebidas prediletas mas do Bourbon gostei. No Nariz notas amendoadas e torradas não muito diferentes de algumas cachaças muito envelhecidas em carvalho e com uma referência ao doce. Na boca, esta referência se concretiza. Em alguns percebe-se também o milho, ou gosto de vegetais cozidos. Os Bourbons que experimentei eram muito mais doces que Uísque e talvez por isso tenha caído no meu gosto. Makers Mark, Wild Turkey, Kentucky Tavern, e um outro em garrafa de dois litros (acho que “Boillet”) foram apreciados nesta viagem. Aos amantes de destilados que tiverem a oportunidade de ir a esta região, recomendo que separem mais tempo para que possam conhecer as destilarias.  Como não visitei in loco, recomendo a navegação virtual prévia pelas páginas das destilarias de Bourbon que são bastante elucidativas.

 A tanoaria é página importante para esta bebida principalmente porque o carvalho utilizado é nativo dos Estados Unidos (Carvalho branco/ Quercus Alba) e bem diferente do europeu. Chama atenção o fato de utilizarem madeira reflorestada para a produção dos barris e nisto pode ser que tenhamos que “aprender” com eles quando se fala do futuro de nossas madeiras nativas para tanoaria. Lembro ainda que alguns produtores de cachaça do Brasil têm importado Barris de carvalho reutilizados de destilarias americanas.
Fotos de arquivo de antigas destilarias norte americanas
 

 Os norte americanos possuem também  “Moon Shine”, à base de milho e que é na verdade o Bourbon sem envelhecimento e atiçou a minha curiosidade. Infelizmente não conheci pessoalmente e faço aqui a solicitação para algum leitor que tenha esta “figurinha” em sua coleção. Um rápido passeio pela web demonstra como a paixão por produzir o próprio destilado é algo muito antigo e forte em outras culturas, e como não poderia deixar de ser, na norte-americana também. Ressalto que por ser uma paixão, por lá também encontramos os "outsiders", clandestinos para alguns, informais como prefiro referir-me. Recomendo aos interessados em Bourbon e Moonshine que visitem o site www.blueridgeinstitute.org/moonshine/index.html onde acharão muito da história destas bebidas


  Como estamos falando de sabores norte americanos não há como deixar de lembrar do milk shake de Bacon do Denni’s e do milk shake de Oreo  (isso mesmo aquele biscoito). Emblemáticos nesta viagem. Segue este vídeo da Revelia analisando um pouco a gastronomia local...rs




  Música
  Algumas coisas chamaram atenção nesta viagerm: a  estrutura da universidade de Louisville é uma delas. Programa recomendável é ir à "Miles Ahead", loja de instrumentos musicais com vários acessórios para instrumento de sopro e ótimo atendimento. A Guitar Center é outro point indispensável.
 Quase no fim de nossa viagem tivemos um presente muito legal. Assistimos à um culto em uma igreja protestante com muita música vocal. Convite de um pianista  amigo do Lolê (nosso multi baterista) estudante da universidade de Louisville .Pudemos presenciar uma das raízes mais fortes da música pop: O gospel. Manhã literalmente abençoada.




  Nossos agradecimentos à:
  Renato Vasconcellos, Mike Tracy, todos os alunos amigos do Lourenço Vasconcellos que se disponibilizaram a ajudar em nossa estadia (Joe, José e tantos que não vou lembrar o nome) sem esquecer dos alunos brasileiros.Aos amigos e fans que de alguma maneira contribuíram para a ida completa da Orquestra nesta empreitada de defesa da música e literatura brasileira (Salve Jorge! Amado).
 E a cachaça?
Provavelmente os defensores da boa e vera branquinha farão a pergunta: mas nada de Cachaça? Esta ficou por lá. Fiz questão de levar alguns exemplares. O que não foi bebido, foi vendido para uma casa que se interessou muito quando disse se tratar de "original taste from small destilarie". Tomaram Juízo fazendo caipirinha com boa cachaça.
  E que o Tio Sam continue querendo conhecer a nossa batucada.

  

sábado, 24 de maio de 2014

Coisas do Sertão

A cachaça de maconha febre no sertão

 Reprodução da materia da Folha de São Paulo 23/05/2014
DANIEL CARVALHO, DE CABROBÓ (PE)
Encravado no “polígono da maconha”, região pernambucana famosa pela produção da erva em áreas irrigadas pelo rio São Francisco, o município de Cabrobó (a 531 km do Recife) vem se tornando conhecido por um “souvenir” peculiar: uma cachaça artesanal com raiz de maconha, a “Pitúconha”.
É fácil encontrá-la em bares e carrinhos que vendem espetinhos de carne.
Os interessados encontram o produto tanto em dose (R$ 1) como em garrafa.
Com o rótulo que se apropria da tradicional marca pernambucana de aguardente Pitú, essa caninha sai por R$ 30.
“Aguardente de cana adoçada com raiz de maconha”, informa, sem pudor, o rótulo da garrafa de 965 ml. “O Ministério do Transporte adverte: o perigo não é um jumento na estrada. O perigo é um burro no volante”, completa, em tom jocoso, o aviso da embalagem.

Cachaça de maconha

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Daniel Carvalho/Folhapress
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Cachaça de raiz de maconha, 'Pitúconha' é vendida como souvenir no sertão pernambucano
Folha conversou com um servidor municipal que, aos finais de semana, vende doses de cachaça de maconha em seu carrinho de churrasco.
Ele diz que algumas pessoas coletam as raízes que sobram das operações policiais de erradicação dos pés de maconha e vendem para os produtores de cachaça. Um saco de 30 kg sai a R$ 100.
O servidor, que vende a cachaça há cinco anos, afirma que chega a comercializar até seis garrafas por semana. “Já virou souvenir. Tem um pessoal do banco que compra de carrada. O pessoal tem muito interesse de conhecer. Houve até um leilão na capital. Saiu por R$ 200″, afirma.
ILEGAL
Segundo a Polícia Federal, ainda não há clareza sobre a situação legal da bebida. Perícia feita pela PF no ano passado indicou pequenas concentrações de THC (tetrahidrocanabinol), o princípio ativo da maconha, nas raízes.
Desde o início do ano, policiais federais e colaboradores que participam das operações de erradicação de plantações da droga foram proibidos de trazer e distribuir as raízes, que, ao contrário do restante da planta, não são incineradas.
“Se você for levar ao pé da letra, seria crime [a comercialização da raiz e, consequentemente, da bebida] porque tem o princípio ativo. Só que a concentração é baixíssima. É uma questão que ainda não se tem uma posição definida”, afirma Carlo Correia, chefe da Delegacia de Repressão a Entorpecentes da Polícia Federal em Pernambuco.
De acordo com o artigo 2º da lei 11.343/2006, “ficam proibidas, em todo o território nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas”.
A exceção é para autorizações legais e para o que estabelece a Convenção de Viena (1971) a respeito de plantas de uso “ritualístico-religioso”.
“A lei não especifica a quantidade de THC. A questão é de ordem prática: a concentração é muito pequena. Não existe uma repressão sistematizada até hoje”, diz o delegado.
Correia afirma que há quem peça raízes aos policiais para tratar dor na coluna, problemas de estômago e asma. “Não existe nenhuma comprovação científica de que a raiz de maconha tenha alguma função terapêutica”, diz o delegado.
PITÚ
Em nota enviada à Folha no final da tarde desta sexta-feira (23), a empresa pernambucana Pitú informou ter tomado conhecimento da bebida “Pitúconha” e “do uso indevido de sua marca”. “A Pitú tomará todas as medidas cabíveis contra a violação dos seus direitos de propriedade intelectual.”







http://brasil.blogfolha.uol.com.br/2014/05/23/a-cachaca-de-maconha-febre-no-sertao/

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Passando a Régua (Estética da Cachaça)

Passando a régua
No final de 2013 fiz uma postagem onde abordava a temática da estética da cachaça. Esta matéria deu o que falar. O mais interessante é que chegou até um dos produtores das cachaças citadas.
 Coloco aqui algumas correções, observações e detalhes sobre apontamentos que fiz e que foram corrigidos. Faço aqui meu agradecimento à intermediação do Gilson Koatz que  possibilitou meu contato com a “Engenho D’Ouro”. Agradecimento também  ao Norival, produtor da cachaça  de mesmo nome que além de atencioso demonstrou ser profundo conhecedor e apaixonado pelo que faz.  
Recomendo primeiramente a leitura da postagem original (estética da cachaça) para prosseguir com esta. Aos mais interessados pelo mundo das alambicagens eis alguns assuntos de estudo. Vamos à conversa que está separada por e-mails. As minhas respostas estão escritas em vermelho:

1° Email

Norival, escrevo para você pois gostaria de fazer as correções que forem necessárias na matéria do blog e só publicarei com sua autorização.
Agradeço a atenção na leitura e parabenizo pelo produto que de alguma maneira passou a ser protagonista da matéria. Espero em outro momento poder fazer uma postagem exclusiva da Engenho D'ouro. Encaminho destacado alguns comentários sobre sua resposta e fico aberto para outras discordâncias e sugestões.
Um dos objetivos do blog é trazer a produção da cachaça em seus diversos ângulos, e ter a participação de pessoas técnicas e experientes só ajuda a reforçar o blog como um local confiável e seguro em relação à música e a cachaça.
Vamos às observações:

“Alguns comentários do autor acho pertinentes, mas acredito que o mesmo está um tanto desinformado sobre, por exemplo: que o carvalho, longe de tirar acidez, ele agrega acidez ao produto;
(Gilson, tenho esta informação de que o carvalho e outras madeiras como a imburana e a castanheira podem aumentar a acidez da bebida)

  A você leitor segue uma pequena amostra de textos que abordam a temática.
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101...


www2.fcfar.unesp.br/Home/Pos-graduacao/.../Michelle_CaiadoME.pdf

www.jornadasaugm.ufpr.br/augm_cd/nucleos/232.html
http://www.jornadasaugm.ufpr.br/augm_cd/nucleos/232.html
veja.abril.com.br/idade/estacao/veja_recomenda/080306/cachaca.html
www.enq.ufsc.br/labs/probio/disc_eng_bioq/...grad.../cachaca.doc


que não existe madeira neutra, o barril se torna neutro pelo seu tempo de uso, mas sempre imprime algum aroma no destilado. 
(Concordo com você. O que quis dizer na matéria é que alguns armazenamentos conferem um amadeiramento menos ativo. O termo “madeiras neutras” têm sido atribuído à dornas que geralmente possuem mais de 700lts e são bastante utilizados , de Jequitibá, Tapinuã, Amendoim, Freijó dentre outras. Sabemos que a manutenção de uma dorna de mais de 1000lts traz questões práticas que fazem com que  geralmente não sejam “raspadas”ou “queimadas” como os clássicos barris de carvalho de 200lts ou 400 lts, e isto interfere na estética do produto. Na própria matéria cito a cachaça Claudionor (Januária-MG) que fica na imburana, adquire pouca cor e um aroma menos amadeirado que outras cachaças de imburana, muito provavelmente por conta do tamanho do tonel, tempo de uso e período de armazenamento. Lembro que uma das madeiras mais ativas é o Jatobá e temos um exemplo clássico que é o da cachaça Colombina de Alvinópolis-MG. Ela é armazenada em paróis muito antigos de Jatobá, o que confere um tímido amarelo palha e um sabor muito sutil também, muito diferente por exemplo da “Bento Velho” de Conceição do Mato Dentro-MG que é armazenado na mesma madeira e possui tonalidade e sabor mais ativos. Talvez tenhamos que começar a utilizar outro termo e salientar que neutro mesmo só o aço inox pois até mesmo o vidro no caso de garrafões expõem a bebida à luz e sabemos que existem estudos sobre a mudança organoléptica de várias bebidas expostas à luz solar. O termo "neutro" poderia até ser substituído por "baixo amadeiramento".
  Acredito que essa discussão já demonstra um cuidado maior no uso dos termos e uma evolução nos processos de estudo da cachaça).

Quanto à acidez na nossa cachaça, sempre foi muito baixa. Em momento nenhum passou de 35, e a máxima permitida é de 150.
(Concordo com o que você diz, e talvez este seja mais um elemento que faz com que, na minha opinião, seu produto possua uma estética que se distancia das demais de sua região. Quando me referia ao produtor armazenar um produto para obter redução de acidez de fato me expressei mal pois me referia ao fato de que o destilado principalmente nos três primeiros meses passa por modificações sensoriais que alteram muito o produto quando comparado ao momento da alambicagem..Uma destas modificações pode ser de acidez, de graduação alcoólica, obtenção de ésteres...(você sabe isto mais que eu).

Quanto a diluição, fazemos sim, pois, alambique aquecido a vapor e com deflegmador, concentra o destilado e o mesmo precisa ser diluído, para que não vá água fraca para o coração do produto final.

(Pediria para explicar melhor. Quando diz "para que não vá água fraca para o coração” se refere a não utilizar a água fraca como meio de reduzir a graduação o que sabemos que é (ou já foi) muito comum em outros alambiques? Até onde sei o deflegmador controla a temperatura de destilação dentro da coluna e o refluxo que necessariamente resulta em um destilado de maior concentração. Se puder explicar melhor agradeço mais uma vez).
As nossas dornas de fermentação nunca foram de alvenaria, no início eram de fibra de vidro. ( posso ter me confundido. Peço desculpas pelo equívoco!) Quem usava dorna de alvenaria era  a Corisco.

Acredito que o Thiago não saiba que também temos cachaça no jequitibá.
(estou ciente que possuem uma cachaça de jequitibá. Ressalto que foi um dos primeiros alambiques que vi identificar a madeira jequitibá. Na oportunidade a garrafa era uma de 700ml parecida com estas de cidra vedada com rolha e o destilador era um com coluna de chapa lisa, não parecia ser "martelado". Na última vez que visitei o alambique este destilador  estava "encostado".
Mais uma vez obrigado pela atenção
Um abraço forte como cachaça


2° Email

Prezado Thiago.

Para mim, é sempre um grande prazer dialogar sobre cachaça
com pessoas que se interessam pelo assunto.

Quanto as dornas, não há o que desculpar.
Realmente no início, o nosso alambique era de chapa lisa, 
tens toda razão.
Mas, já há 10 anos o nosso alambique é todo de chapa rebatida, 
à mão, e foi produzido pela empresa Alambiques Sta. Efigênia.
O mesmo é aquecido à vapor e possui deflegmador.

É isso mesmo, a diluição é para que não vá água fraca para a cachaça.
No momento da destilação, quando a segunda fração do destilado (coração)
termina, entra na água fraca, muito bem, o que nós não fazemos é isso, chegar no grau
desejado, continuando a destilação, ou seja, cortamos neste momento, ficando
então a bebida com um grau elevado, mas de altíssima qualidade, e é por isso 
que o destilado deve ser diluído com água, na verdade, desmineralizada.

Obs. A água usada na  diluição da nossa cachaça, vem de uma nascente no 
meio do nosso canavial.
Depois de filtrada, desmineralizada, ela é usada para fazer então a diluição.

Estamos sempre aberto a comentários, discussões esclarecimentos, críticas
a respeito da cachaça, a qual faço com a maior paixão.

Muito obrigado.
Norival 


quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

"Retomando" as atividades

“Retomando” as atividades
 Por Thiago Pires

Estive sumido é verdade. Sumido como alguns rótulos de cachaça que somem e voltam.  Agradeço a sua visita nas cercanias deste blog pois para mim o que importa é contar com sua atenção e um dedinho de “prova” /prosa.
O universo da cachaça tem mudado muito e acompanhar estas mudanças não é algo fácil. Aqui no blog, tento abordar algumas destas mudanças de maneira “artesanal”. Digo artesanal pois escrevo por que gosto de compartilhar com todos minhas aventuranças e estudos  no mundo da cachaça e da música e o faço de maneira voluntária com o apoio e contribuição de ideias, comentários e postagens de pessoas que compartilham do mesmo gosto. Portanto fique à vontade para dar sua contribuição.
Ano passado (2013) tivemos o  Sr. Tito da Loja “Tonel e Pinga” no município de Niterói pertinho do Rio, declarando que passaria a fazer as  degustações abertas de sua loja de maneira bimestral e não mais mensal como sempre fora. Segundo ele, um dos principais objetivos das degustações era apresentar a Cachaça para um público novo, que ainda não tinha informações ou que tinha informações equivocadas além de acabar com o estigma em torno da bebida. Para Tito, boa parte desta missão tinha sido alcançada. Tenho que concordar. Apesar de ver que muito ainda pode ser feito, hoje sem dúvida a cachaça de alambique têm seu espaço  em mercados e bares posto que já tinha seu espaço no paladar dos brasileiros.
Para mostrar como a cachaça têm mudado reescrevo aqui os temores de um dos maiores poetas brasileiros que com sua tímida  mineirice “carioca” soube apresentar seus anseios  quanto aos rumos de nossa bebida. Atenção para a data. Plena industrialização dos engenhos de cana. Hoje vemos que alguns destes medos foram vencidos. Resta-nos identificar quais os novos desafios de nossa bebida, pois estes têm batido sutilmente às nossas portas, adegas, bolsos, coleções, degustações e discussões.

“(...) O que ouço dizer é que quase não se fabrica mais cachaça das boas, das purinhas, que não perdem para o mais requintado licor de frades, e faziam a glória  de cidades mineiras, fluminenses, pernambucanas. Chegamos à tristeza dos cachaceiros sem cachaça digna do nome, o que também desmoraliza aqueles. Alguns raros brasileiros a produzem em quantidade limitada, para o prazer de tê-la em casa e obsequiar a visita de connoiseurs. É uma tradição que se vai, com a industrialização do álcool, a adulteração dos elementos genuínos, a crescente perda de sabores que constituíam herança cultural brasileira. Será que daqui a pouco os amadores da vera branquinha se limitarão a lê-la em vez de bebê-la? Ou terão de assaltar o museu da cachaça que alguns colecionadores escondem em casa como prata do Peru  e louça da Índia? (...)”  

Texto extraído do prefácio de Carlos Drummond de Andrade para o livro “Dicionário Folclórico da Cachaça” de Mário Souto Maior. 

(DRUMMOND, 1976 apud MAIOR, 2013)

DRUMMOND, Carlos.  Cachaça em Dicionário. Jornal do Brasil 01/11/1976  apud  MAIOR, Mário Souto. Dicionário Folclórico da Cachaça. Fundação Joaquim Nabuco. Ed Massangana. Recife: 2013.