segunda-feira, 6 de março de 2017

Dicas de visita à Alambiques

Dicas de visita à Alambiques




Para melhor aproveitar a farta agenda de feriados deste ano seguem algumas dicas para iniciantes no universo da cachaça. Alguns anos de experiência me fazem compartilhar estas dicas que não são necessariamente um manual mas que seguidos, podem evitar ressacas!

1. Visite o alambique preferencialmente no período de safra



Visitar um alambique é sempre interessante mas visitar um alambique em pleno funcionamento é uma experiência para os sentidos. O período de produção pode variar de região para região. No nordeste é  possível encontrar um engenho alambicando no mês de Janeiro ou fevereiro algo bem improvável na região sudeste por exemplo. Em alguns casos mesmo fora do período de safra o produtor alambica ou para poder fazer o corte de um talhão de cana ou até mesmo para realambicar uma cachaça que por algum motivo julgou não estar “no padrão”.

2. Visite um alambique de uma cachaça que já conhece (experimentou)


Quem estuda o universo da cachaça tem sempre curiosidades sobre a produção de uma cachaça que já bebeu. A roda D’agua da Corisco( Paraty- RJ), os Paróis de Jatobá da Colombina (Alvinópolis- MG), o zelo da Werneck (Rio das Flores- RJ) ou o equipamento Tromba de elefante da Canarinha (Salinas- MG) já são elementos para tentar conhecer de perto aquilo que experimentamos tão longe do alambique.

3. Tem que ser bom para as duas partes


Sabemos que nem sempre dá para viajar durante os dias de semana mas lembramos que um alambique é uma unidade produtora, na maioria das vezes familiar. Parar no domingo pela manhã na porteira de um alambique sem aviso prévio pode ser bem inconveniente. Por estas e outras fique atento à próxima dica.


4. Agende sua visita



Os produtores de cachaça costumam receber apresentando a unidade produtora, falando de sua relação e histórico com a bebida e promovendo uma degustação de suas safras. Os rótulos sempre têm indicações de contato como telefone ou email. Planejar a visita é sempre melhor.

Exemplo: Se você não tiver nenhum contato com as cachaças de Paraty e quiser ter esta primeira experiência, o  já tradicional festival da Pinga de Paraty que acontece sempre na terceira semana de agosto é uma ótima oportunidade porém se você quiser conhecer os alambiques esta pode não ser a melhor época pois os produtores destinam toda sua atenção e produção para abastecer os stands do festival. Já tive a oportunidade de chegar em alambique no festival da pinga e produtor não poder dar muita atenção por estar colando rótulos em garrafas.

Importante: Procure ser atento ao nome das pessoas com quem fala. Falou com o João Luiz da Magnífica ou com o Dimas (seu funcionário há tempos?). Isto é será muito importante quando estiver mais próximo do alambique.


5. Geografia


Poucas coisas nos ensinam tanto a divisão geo-política de nossa cidades quanto a cachaça. É importantíssimo conhecer o nome da localidade, do distrito e em alguns casos da comunidade onde a cachaça é feita. Com isso vamos observar que muitas cachaças de Salinas – MG são de Novo Horizonte e região. Portanto fique atento!

Exemplo: A citada Magnífica, é produzida em Vassouras no estado do Rio de Janeiro mas seu acesso é muito mais fácil pela vizinha Miguel Pereira.

Importante: As distâncias vão se tornando cada vez maiores quanto mais para a região norte -nordeste. Erros de comunicação ou interpretação podem fazer a viagem aumentar quilômetros.

6. Disse que vai, vá!


O produtor rural tem uma rotina pautada pelo trabalho. O fato de seu trabalho ser do lado de casa não quer dizer que sempre possa parar para receber um visitante. Por isso se marcou por telefone ou email (whatsapp tem funcionado muito nos interiores) procure ser pontual. A pontualidade e a palavra são atributos valiosos principalmente no mundo rural. Se disse que vai, vá que eles estarão te esperando. Desmarque apenas em casos extremos (chuva, doença, imprevistos). Como escrito no item 4 geralmente os produtores  se preparam para receber os visitantes.

7. O tempo da roça é outro



Isso mesmo! No mundo rural menos é mais. É muito comum em regiões produtoras existirem dois alambiques  muito próximos. Vai por mim, escolha um visite em um dia e no seguinte visite o outro. Fazer as coisas correndo não tem nada a ver com o ritmo rural e mesmo com o ritmo da cachaça. Imagina que você pode dar a sorte de chegar em um engenho e eles estarem alambicando ou o alambiqueiro pedir para você acompanhar a destilação até o corte da cauda? Meio deselegante um visitante dizer não né?

Os produtores de cachaça costumam ser bons de papo (Maria Isabel em Paraty -RJ, Nando Chaves em Cel. Xavier Chaves só para citar dois emblemáticos) por isso reserve este tempo. A prosa é tão sagrada quanto o brinde. Se puder articular uma hospedagem próximo ao alambique melhor ainda. Dê preferência para o turno da manhã onde o alambiqueiro certamente não terá seu horário de trabalho alterado por conta de sua visita. Se tiver que fazer na parte da tarde vá depois do almoço, mas no fim de tarde (16hs por exemplo) já é fim de jornada de trabalho nesses interiores.  

8. Se beber não dirija mesmo



Evite ao máximo dirigir pós alambique. Se tiver que fazê-lo, prepare-se bebendo menos e se hidratando bastante fazendo posteriormente uma refeição reforçada como um almoço e descansar. Alambique é um ótimo programa, evite ir sozinho até para poder dividir essa responsabilidade com outro motorista.

9. Sempre temos que lembrar de alguém


 Mesmo que esteja com a adega cheia é bom lembrar do item 3. Comprar alguma coisa no alambique é super de bom tom. Se não quiser levar cachaça( como assim?) sempre têm alguma pimenta ou outra coisa que no mínimo será bom para estabelecer uma boa relação com aqueles que já abriram seus barris e estão te recebendo.

OBS. Tenho o hábito de pedir o autógrafo dos alambiqueiros.Recomendo. Isto personaliza a cachaça e valoriza ainda mais o trabalho destes!

10. As Águas vão rolar e temos o dia seguinte né



É bom não exagerar .  As lembranças quando são boas não dão ressaca.     

Boas viagens


sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

A folia do Santa Marta

Estandarte da folia



Nessas ideias que nos batem  meio que do nada (sou acometido por elas direto) este ano sonhei com uma folia de reis que saía de Laranjeiras e ia até Botafogo. Conversei com algumas pessoas a fim de resolver a folia do lado de cá, laranjeiras, já que do lado de lá já tem sua folia. Confesso que não tive o êxito que queria mas pude conhecer um pouco melhor a famosa folia do Santa Marta.
Palhaços da Folia


O grande Luis Cláudio (sim o Muca) foi quem me colocou em contato com Juninho da folia. Juninho me explicou que seu avó veio de Miracema (noroeste fluminense na divisa do estado do Rio com Minas) e se estabeleceu na Ilha do Governador. Da ilha do governador migrou para a comunidade do Santa Marta levando também o folguedo.
Sr Luizinho (sanfoneiro) e Mestre Riquinho 



Segundo Juninho , as folias do estado do Rio tendem a encerrar suas atividades no período de reis mas as folias da cidade do Rio de Janeiro encerram as atividades no dia vinte de janeiro, por conta do padroeiro da cidade, São Sebastião.





Enfim, esta não é uma “matéria” sobre a folia. É muito mais o compartilhar de uma experiência com um folguedo  de origem rural que já foi muito mais presente e hoje é feito por foliões resistentes e que numa cidade tão urbana como o Rio ainda mantêm o hábito de visitar os donos da casa.




 Ano que vem tem! Quem vem?


Agradecimento



Eu não são tão bom no verso

Mas na arte tenho meu traço

Subimos o Santa Marta com a folia

Na timidez e com certo embaraço

Luis Claudio foi o contato

Que levou ao palhaço Juninho

Bom de verso e importante

Para a folia de Mestre Riquinho

Fica aqui o agradecimento

De Mariana, Jaqueline e Thiago

Louvando a Santo reis

E o nosso padroeiro

São Sebastião do Rio de janeiro

Deixamos aqui o nosso recado

“...Sanfona...”

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Pioneirismo e diferencial


Coloco aqui algumas observações  que acredito muito interessantes do modo de fazer cachaça de Nando Chaves:

Foto : arquivo de Nando Chaves

Canavial

Utiliza majoritariamente cana própria. O que não produz é de vizinhos próximos que acabam cultivando a mesma variedade. Nando possui muito cuidado com sua matéria-prima. Em conversa com ele ao perceber que havia uma flor de cana no canavial (pendão) ele afirma: “...aquelas canas precisam ser cortadas pois ao produzir a flor, a energia toda do caule da planta é dirigida para manter a flor viva e com isso perde sacarose.
Sua variedade de cana fora adquirida através da universidade de Viçosa com um produtor de Cataguases. A variedade é originária da cidade de Coimbatore na Índia.



Moagem

Além da bucólica roda d’água o Engenho Boa Vista possui uma moenda elétrica para que nos períodos em que todas as dornas estiverem fermentando possa auxiliar a moagem da primeira que é mais lenta. Nando desenvolveu uma área de armazenamento de cana toda feita de bambus o que dá um visual rústico porém funcional e barato. O bagaço de cana é separado em secos (mais antigos) e úmidos (mais novos). Com isso controla a combustão do fogo para a fornalha.

Moinho de pedra onde prepara o fubá



Fermentação

Utiliza fermento caipira com milho criolo (não híbrido) plantado no meio do canavial. Com isso ele consegue fazer com que os micro-organismos que deseja no flavour (tanto leveduras como bactérias) estejam presentes no milho que vai fermentar o caldo. 
Um exemplo da relação de Nando com o meio ambiente é a observação em relação aos insetos que se manifestam “interessados” na fermentação. Segundo ele se tiver mosca varejeira ou pulgão de canavial rondando a área de fermentação é sinal de que o processo está acontecendo harmonicamente porém se ver alguma drosófila (mosquinha da banana) começa a se preocupar com a acidez do caldo. 
Algo que achei interessantíssimo é que ao se aproximar das dornas de fermentação para me mostrar o caldo abaixou o tom de voz pedindo para evitar falar próximo ao fermento até porque tinha perdido um pé de cuba há poucos dias.
Suas dornas de fermentação são caixas de aço inox encaixadas em tanques de alvenaria que era onde antigamente o caldo era fermentado.


Destilação

Utiliza um equipamento de fogo direto com capelo e serpentina. O modelo é sem deflegmador mas possui pratos internos no comprimento da coluna. Nando encomendou a coluna orientando a empresa construtora em relação ao modelo que queria, pois segundo ele tinha que ser do mesmo sistema do anterior. Quando lhe perguntei sobre destiladores ele disse: “...tenho algumas panelas e algumas colunas em um depósito aqui, não jogo nada fora..”
Aquecimento direto

Como já escrito, controla a temperatura da fornalha alimentando-a com diferentes tipos de bagaço. O mais seco será utilizado para levantar o início do fogo. Ao começar a destilar o coração utiliza um bagaço mais úmido que lhe permite controlar a temperatura e alambicar a fogo baixo. Isto nos dias atuais é cada vez mais raro com a maior utilização dos alambiques a vapor de caldeira onde o aquecimento é gradual e exige do alambiqueiro abrir e fechar os registros de alimentação de água e eventualmente mais bagaço ou lenha para a caldeira. Até pouco tempo Nando alambicava com uma panela sem termômetro e como teve que mudar de panela a empresa acabou adaptando um termômetro que ele diz ser até dispensável pelo tanto que conhecem o forno e o destilador. Com isso Nando afirma:
“...o cara pode ter feito curso de mestre alambiqueiro  no melhor curso existente e ser muito bom mas aqui ele precisa alambicar nos moldes do Séc. XVIII. Por isso se chegar alguém aqui querendo fazer o serviço de alambiqueiro, a primeira função que terá que fazer é carregar bagaço pois ali ele vai entender o consumo do forno...”
Segundo Nando, sua taxa de cobre é muito baixa porque alambica todo ano e ressalta a importância disso para que o cobre seja sempre baixo independente de filtro para este tipo de metal. Para este tipo de equipamento possui um rendimento muito bom onde tira 100lts por cada alambicada. A panela possui 600 lts de caldo.

Descanso
Sua cachaça antigamente repousava em uma cisterna subterrânea de pedra parafinada. Com a exigência do ministério da agricultura teve que adquirir dornas de aço inox para sua cachaça. Atualmente pensa em transformar o espaço da cisterna em uma área de armazenamento de tonéis de aço inox.
Não possui tonéis de madeira, mas isto não significa que não repouse sua cachaça, pois possui diferentes cachaças brancas todas separadas por safra .

Engarrafamento

Possui dois tipos de embalagem, uma garrafa de 670 ml onde vende a safra do ano anterior, sendo portanto sua cachaça mais nova e as de safras mais antigas nas garrafas reutilizadas de vinho de 750ml, com rótulo e contra-rótulo muito mais simples. Esta última também é vendida em garrafa de 670ml em um rótulo vermelho. A garrafa que a princípio seria mais barata, utiliza para a bebida mais nobre, agregando valor com lacre tradicionalmente metálico e rolha de cortiça. Um conceito tradicional a um produto tradicional. Sabiamente agrega valor. Como disse possui dos três rótulos um em embalagem de papel comum e outros dois com uma belíssima arte influenciada por Dona Cida Chaves autora do texto que apresenta a cachaça no contra-rótulo.

Distribuição

Cinco mil litros de sua produção são destinados a “Santo Grau” que se mostrou uma importante parceira neste processo de valorização de engenhos históricos. Nando contou-nos dos desafios de trabalhar com uma empresa que se tornou multi-nacional e hoje por exemplo consegue distribuir a  Santo grau Séc. XVIII em todos os free-shops de aeroportos do Brasil. Para ele isto seria impensável sozinho. O que é interessante é que a Santo grau consegue ter um produto conceitual, agregando valor e reconhecendo um lado cruscial para o universo da cachaça: a cultura. É importante citar o trabalho da Santo Grau pois distribuir cachaça em um país como o nosso com tantas questões de infra-estrutura é uma missão e tanto. Bom ver que a melhor negociação é aquela em que todos saem ganhando.

Para os produtores fica o exemplo  de que ter um cliente fixo com capacidade de distribuição pode ser uma boa solução para evitar cachaça "encalhada" em barril.

Aproximadamente quarenta e cinco mil litros são engarrafados e distribuídos  por Nando como Cachaça Séc. XVIII na região e para todo o país, outra grande responsabilidade.


 



A degustação

“ Pimenta que não arde, cachorro que não morde, cachaça que não é forte não resolve”

A cachaça Séc. XVIII talvez seja o melhor exemplo de cachaça rústica que tanto tenho abordado neste blog. Aroma adocicado lembrando cana colhida na hora, com o frescor de um dia de chuva. Sente-se um frescor vivo no aroma. No paladar a confirmação do doce com um ligeiro metálico que pode ser confundido com um mineral. Servida no copo já demonstra seu tradicionalismo em um lindo rosário. Coisa fina, coisa da antiga. Chama atenção a persistência destas borbulhas e a viscosidade viva que possui. Isto principalmente na cachaça mais nova.
No alambique as mais novas que experimentamos  foram a safra do ano (2015) e a que batizei como da “semana” (agosto de 2016). Todas estas referências se tornam mais amenas nas cachaças com mais tempo, mas sem que sumam , estão lá mostrando o trabalho do tempo, aperfeiçoando uma matriz que já começa muito bem.

Nando serviu-nos uma safra de 2014  espetacularmente doce, segundo ele reflexo de um ano de safra com pouquíssimas chuvas. Retro-gosto de cana e fundo de copo de cana lembrando o doce.

Ressalta-se que é uma cachaça simples (possui muito corpo) e este é seu maior atributo pois enquanto cachaça branca traz todas as referências que se procuram na imagem inconsciente da cachaça branca (cheiro de bagaço de cana ou cana, milho, doce,  frutas, erval, capim, fermento...). Ótimo exemplo de cachaça com graduação alcoólica alta e controle de acidez 47 e 48° GL.  

Aos que querem se aproximar mais das branquinhas recomendo um experiência: degustar a Século XVIII nova (rótulo azul) comparando-a com o exemplar de mais de dois anos (rótulo vermelho)  e com a Santo Grau Coronel Xavier Chaves. Uma experiência que rende muito aprendizado sobre padronização, graduação alcoólica, acidez e certamente a estética da cachaça branca.

Fundo de copo (acabando a degustação)

Nestes dias em que percebemos a força do mercado e “...da grana que ergue e destrói coisas belas... ( Caetano Veloso)” dá orgulho beber uma cachaça que não está nem um pouco interessada em seguir a moda ou a tendência dos habituais 38°, 39° no máximo 42°GL de graduação alcoólica.  Lembro que as cachaças de Salinas tinham geralmente no mínimo 45°GL e o que vemos hoje é a expansão das graduações baixas, salvo exceções de produtores que seguem a mesma linha tradicional que Nando Chaves ( a Havana/ Anísio Santiago/ Havaninha possuem 48°) ou a nova "Bruta" da cachaça Mil Montes de Faria Lemos- MG.

O Engenho Boa Vista também traz o debate acerca de alambiques históricos. Até que ponto é necessário que mudem sua produção? Até que ponto precisam se adequar ou a legislação é que tem que contemplar a trajetória destes, criando exceções? Imaginemos o quanto alambiques como o do Sr Anísio Santiago (Havana- Salinas), que não é secular, tiveram que se adequar? Será que algum dia aquela destilação com "tromba de elefante" pode vir a ser proibida alegando-se outros padrões de produção e consumo?   Temos vários alambiques com mais de cem anos  em operação e esta característica é uma importante forma de valorizar a unidade produtora e colocá-la como testemunho da mudança das formas de fazer cachaça. É importante refletir sobre isto neste momento em que padrões têm sido estabelecidos.

  Rústica Mesmo!

Gostou do estilão forte da Séc XVIII? Aos que gostam das graduações alcoólicas mais elevadas em cachaças brancas (sou fã) fica uma relação para estudo que acredito básica de se ter em casa:

Rainha- Bananal PB (aguardente)
Aroeirinha- Porto Firme MG
Vitorina Branca – Fortuna de Minas
Cachaça Cachoeira de Cachaça – Vassouras- RJ
Mil Montes “Bruta”- Faria Lemos- MG
Corisco- Paraty- RJ

 Saideira


 Nando possui um compromisso com seus clientes, com a reputação de sua família e com o próprio tempo pois representa a história prática de fazeres que remetem ao Séc. XVIII. Lembro que quando o produtor abaixa sua graduação alcoólica ele possui um maior rendimento em termos financeiros e por isso o custo benefício da cachaça Séc. XVIII a incluiu em um produto de comércio justo. Possui um preço totalmente compatível com sua história e com o trabalho dos envolvidos. 
Nando chaves orgulha-se de gerenciar o engenho há 25 anos e diz:
“...Thiago, desde que me entendo por gente, não houve um ano que não se fizesse cachaça neste engenho..”.
 Para quem sabe o trabalho de produzir cachaça isto é um título para poucos. 
Como diz o texto de dona Cida Chaves: “....o tempo pede paciência e humildade. Poucos litros de cada vez para a qualidade acima de tudo. Isto faz a diferença...”
  O tempo não se engana mesmo!

Agradecimentos


Fica o primeiro agradecimento ao gaúcho Moraes, pessoa fundamental para que eu tivesse a  breve experiência de produzir a cachaça Tio Anastácio em Saquarema- RJ. Desde que me entendo amigo de Moraes que ele fala do "Nandinho". A paixão por cavalos e cachorros além de um grande amigo comum ( o agrônomo Rondon) aproximou estas duas pessoas. Foi assim que fui à Séc. XVIII conhecendo muito de Nando e praticamente com uma carta de apresentação de Moraes.


A sr Rubem Chaves e Dona Cida Chaves. O primeiro, paciente, quieto, de sorriso discreto e super acolhedor, a segunda uma pessoa encantadora talentosa com quem conversamos muito sobre política, história, feminismo, arte e  literatura. Tivemos a honra de ser agraciados por Dona Cida com alguns de seus livros. Dona Cida, esteja certa de que meus alunos se encantaram com  a Sossô.
Livros de autoria de Cida Chaves


A Jaqueline Luz, companheira que sempre registra as fotos e vídeos. Amante  e conhecedora destes interiores brasileiros;

A Nando Chaves  que nos recebeu super bem com sua "levitação sem meditação" (procurem saber) e que além de dar uma aula sobre cachaça é capaz de contar grandes causos e histórias, de sua vida e sua região. É o garoto propaganda que nos faz procurar a cachaça do Nando por mais que tenham eles sete gerações de história com cachaça.

A você que acompanhou estes relatos um abraço forte como uma Séc. XVIII.

  Dedico este último vídeo a Dona Cida Chaves a quem fiquei devendo uma prosa de viola. Esta é a sua cozinha Dona Cida antes do café!



segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Segredos que aos poucos os laboratórios vão desvendando


Nando explica o porque da coluna com Capelo

Após sermos recebidos por Nando chaves, ali em seu escritório escutamos uma verdadeira aula de história da produção de cachaça no Brasil já que falou do período de profissionalização e modernização dos alambiques a partir da legislação que de fato regulamentou o produto embora tenha ajudado a fechar muitos engenhos. A maioria destes alambiques não tinham condições financeiras de atender às exigências, que muitas das vezes não consideravam a realidade dos produtores.
Rótulo tradicional. Safra 2003
 O produtor deu um exemplo muito prático: pelo ministério da agricultura teve que “telar” as dornas de fermentação para protegê-las de agentes externos. O que ocorre de fato é que com a elevação do volume do caldo na fase tumultuosa ( a fase mais agitada) este caldo fermentado acaba encostando na tela e deixando-a suja de caldo e favorecendo mais contaminações bacterianas do que se não houvesse tela alguma.









a "envelhecida"





Segundo Nando: “...desde a época de meu avô ouvia dizer que a bebida tinha que ser protegida da radiação solar. Por isso que várias bebidas são armazenadas em garrafas escuras. Quando falávamos isto em relação à cachaça tinha gente que falava que não tinha nada a ver por conta da graduação alcoólica. Outro dia recebi aqui no alambique uma pesquisadora que estava estudando justamente sobre a influência dos raios ultra-violeta no armazenamento da cachaça...”

Nando se mostrou atento às tendências do mercado como os blends e amadeiramentos intensos mas segundo ele há um equívoco: costuma-se associar  a alteração dos atributos sensoriais do produto cachaça somente à ação das madeiras, o que é correto em parte pois ainda que seja uma cachaça branca, esta se “acomoda” quimicamente com o passar do tempo. A prova disto é que diferente da maioria dos alambiques Nando possui somente cachaças brancas porém separadas por safra. Após degustar suas diferentes safras, todas brancas sem madeira alguma, percebemos claramente a diferença de uma safra para outra. E conseguimos sim perceber como o tempo interfere em uma bebida, mesmo que esta esteja descansando em um tonel de aço inox ou mesmo dentro da garrafa. Esta característica faz com que Nando possa provar o que durante muito tempo fora apenas uma hipótese. A acomodação química do destilado é constante, mais perceptível quanto mais novo, mesmo dentro da garrafa.


Rótulo da cachaça mais nova (um ano)



Entre o novo e o velho: o tempo

O mundo da cachaça têm mudado muito. Observamos alguns valores estéticos de outras bebidas sendo aplicados à cachaça e um destes conceitos é o do envelhecimento intenso em madeiras. Do ponto de vista sensorial é riquíssimo dialogar com a diversidade de madeiras que possuímos porém se pensarmos na perspectiva do produtor o glamour das caves e adegas pode se tornar opaco.

Quando um produtor menos experiente se lança no mercado da cachaça, um dos insumos vendidos como indispensáveis são os barris. É preciso porém que este produtor tenha uma experiência mínima com amadeiramentos. Quanto mais novo o barril geralmente mais tanino e mais difícil controlar o amadeiramento. Isto mesmo nas madeiras ditas "neutras" que na verdade não são neutras pois conferem menos amadeiramento ou por conta das características da madeira, pelo tempo de uso ou por conta do volume do tonel. Neutro mesmo só o vidro e o aço inox! Quando um produtor possui barris para armazenar cinquenta, cem mil litros ele está obrigado a produzir cachaça praticamente todo ano. A menos que não queira ou não precise vendê-la e deixa-la armazenada, do contrário terá que pensar no que fazer com esta cachaça amadeirada. Ainda que o armazenamento tenha o tempo como unidade de medida, o produtor precisa atentar para alguns cuidados como a evaporação do destilado nos barris, a temperatura da adega, a acidez conferida pelo armazenamento, o próprio sabor da bebida dentro do barril (algum barril pode apresentar alguma questão como broca, vazamento, contato da bebida com o aro), o padrão do produto final... Isto obriga o produtor a estar em constante controle dos barris. Obriga o produtor a conhecer cada barril, principalmente os fora de padrão (mais ou menos tanino).

Nando Chaves questiona porque utilizar uma matriz de qualidade tradicional (a cachaça branca) que possui seu público é economicamente mais vendável e transformá-la blend?
 “...meu avô,  que trabalhava com bebidas no interior de São Paulo, já fazia blend há muito tempo. Ele chamava de “receitas”. Ele tinha receita para cachaças aromatizadas e coloridas. Ele fazia cachaça da cor  e sabor que quisesse . Aqui fazemos cachaça sem vergonha de ser cachaça...”, portanto branquinha!

Nando expõe todas as autorizações e análises de seu produto
Nossa próxima postagem aborda os fatores de pioneirismo e diferenciais da Cachaça Séc. XVIII. Muito tempo de história, que nós humildemente vamos descobrindo e compartilhando neste blog.

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

No Alambique

No Alambique
Engenho Boa Vista: rústico e original como sua cachaça


O engenho Boa Vista fica a seiscentos metros de distância da casa de Sr Rubens e Dna Cida Chaves. Quando chegamos no alambique Nando recebia um carregamento de garrafas, conferia nota fiscal, volume das encomendas, enfim já mostrava ali que atua em todas as posições do time “Séc XVIII”.

Ultimamente os alambiques têm tido uma tendência a serem parecidos, ou pelo menos previsíveis, nos projetos. Conceitos de eficiência, lucratividade e as exigências do MAPA fazem com que muitos alambiques tenham a mesma marca e modelos de moenda, dornas de fermentação/aço inox, e equipamentos de destilação da marca líder de mercado. Ali no engenho Boa Vista, tudo diferente. Lembrou-me muito alguns alambiques de Paraty há alguns anos atrás, tudo muito simples, funcionando e limpo como têm que ser. Uma pia com um motor para higienizar garrafas de vinho, testemunhando o que hoje chamam de sustentabilidade e que Nando já incorporou como prática há bom tempo. A área de envase separada por uma divisória de vidro colocada para se adaptar as exigências dos fiscais. Adaptação que notoriamente não estava no “projeto original ” até porque o original é do Século XVIII. Ali em seu escritório que é ao mesmo tempo um estoque e almoxarifado Nando começou nosso atendimento.
Área de Envase

O Começo

  Nando falou de sua relação com a Universidade Federal de Viçosa onde se formou em  Zootecnia e adquiriu boa parte dos conhecimentos que de alguma maneira são utilizados na relação de respeito que possui com o meio ambiente na produção de sua cachaça. O produtor está à frente do alambique desde 1989. Antes disso foi responsável por distribuir a cachaça nos bares da região e conta como a partir dali começou a observar os hábitos dos seus consumidores.

  “ ...cada bebedor têm uma mania pra beber cachaça, uns rodam, uns recitam poema, uns dão pro santo  antes de beber, outros oferecem pro santo depois de beber , uns contam causos, mas cada um têm uma mania...” Conta como esta fase foi importante para seu conhecimento e formação no mercado da cachaça. Passou a identificar tipos de consumidores e a partir daí traçou melhor o perfil de identidade que iria trabalhar na Séc. XVIII.
Antes de mostrar o alambique um assunto que chamou nossa atenção foi o da adequação à legislação. Segundo Nando, sua família sempre foi muito preocupada em preservar o patrimônio histórico do engenho mas a partir do momento que o MAPA (Ministério da Agricultura) começou a estabelecer uma relação de maior fiscalização aos alambiques,  eles enquanto produtores não tinham como ao mesmo tempo atender às exigências e preservar sua história. Segundo ele isto cobrou muita perseverança e paciência pois talvez até hoje nossa legislação não abra precedentes para estes casos específicos já que estamos falando de uma unidade produtora de quase trezentos anos.
Projeto do(a) Séc. XVIII

Uma destas adaptações foi a desativação da cisterna subterrânea onde armazenavam sua cachaça que se mantinha branca. O reservatório era escavado na pedra e suas paredes eram calafetadas com parafina. Tiveram que desativar a cisterna e substituir o armazenamento pelo aço inox. O armazenamento em cisternas já fora bastante comum assim como o hábito de enterrar barris para que embaixo da terra o líquido fosse melhor acondicionado. Segredos que os laboratórios foram se apropriando de alguma maneira já que hoje em dia as adegas têm sido feitas em locais úmidos e escuros tendo (às vezes subterrâneos) inclusive com adegas dotadas de medição de umidade e temperatura do ar, o que vez ou outra faz com que o produtor molhe seus barris e jogue água pelo chão da adega em épocas mais quentes ou lugares mais secos.
No próximo capítulo abordaremos os "segredos que aos poucos os laboratórios desvendam" do Engenho Boa Vista.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Primeiros Goles / A pré-produção


Prosa com Nando Chaves


Religiosamente, em suas reuniões, a Confraria de Cachaça Copo Furado do Rio de Janeiro (a primeira do Brasil-1994) pergunta a seus visitantes como foi sua primeira experiência com cachaça. Em vinte e dois anos de existência muitas histórias inusitadas foram registradas em suas atas que revelam sobretudo a relação de afeto que o brasileiro possui com a Cachaça. Rico patrimônio o dessas atas!
Assistindo o vídeo produzido pela Cachaça Santo Grau, você leitor entenderá o figuraça que é o Nando Chaves e perceberá que seus primeiros paços ou "goles" são a história de sua relação familiar com a bebida. Recomendo que assistam.




A Pré- Produção

A ideia inicial era conhecer o alambique em funcionamento. Ainda em abril fiz contato por telefone com Nando Chaves perguntando se saberia quando o engenho começaria a alambicar ao que me respondeu: “...isso depende de São Pedro...” . Entusiasmado explicara que um dos critérios para começar a preparar o fermento é o ponto de maturação da cana.Desta maneira, Nando aguarda a primeira geada para “começar os trabalhos”. A partir da geada a cana começa a atingir seu ponto de maturação já que a cana produz mais sacarose com a queda da temperatura e com a falta de recursos hídricos (a geada acontece com a chegada do inverno que é seco). Já neste momento pude perceber que se tratava de um produtor diferenciado, atento e respeitoso do tempo da terra. Mais que isso, ao citar “São Pedro” evidencia o diálogo tanto com a sabedoria popular de sua região quanto com o conhecimento técnico-científico.



Esta prosa é só para apresentar os preparativos para o período de safra. Embora o vídeo tenha sido feito já no alambique, na próxima postagem falaremos um pouco de como o produtor foi assumindo responsabilidades no trabalho com cachaça começando como distribuidor regional passando por todas as funções do engenho. Não percam!

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Século XVIII aí vamos nós.



No mês de agosto resolvemos uma dívida antiga com o universo da cachaça. Visitamos o Engenho Boa Vista que produz a cachaça Século XVIII  e a matriz da cachaça “ Santo Grau” de Coronel Xavier Chaves na região dos Campos das Vertentes- MG.
Ao procurarmos informações na internet e outras fontes encontraremos muita coisa a respeito desta cachaça a maioria falando de seu passado “inconfidente”. Trata-se de uma das cachaças mais emblemáticas do Brasil!
Esta postagem será feita como uma destilação em “batelada” (fracionada) para que o leitor iniciante ou experiente possa degustar cada informação aos poucos e viajar.

 E para começar nossa viagem fica a dica do vídeo institucional do “ Circuito Turístico Trilha dos Incondifentes” /tvlocal produtora, onde Nando Chaves apresenta a Séc. XVIII e o Engenho Boa Vista. Os motivos para acompanhar as próximas postagens ele fala e deixa bem claro. Então não perde tempo tenta arrumar uma Séc XVII porque sabor o computador ainda não passa.



Nas próximas postagens abordaremos o protagonismo de Nando Chaves na produção da Séc.XVIII, apontaremos como este produto ainda se destaca em um mercado tão concorrente e mostrar como a Séc. XVIII têm enfrentado os desafios de preservar seu patrimônio histórico e cultural em relação às exigências atuais de mercado e legislação (Ministério da Agricultura) afinal cachaça temos muitas porém com quase trezentos anos de história, essa é única, então não deixe de acompanhar.
  Agradecimento a Eduardo Rodrigues da Produtora Local que disponibilizou o vídeo. O mesmo encontra-se no You Tube.