Na Fazenda Havana
E assim de moto
táxi subi em direção a Novo Horizonte. Havia marcado com Cléber e Geraldo Santiago minha
ida pela manhã e às nove em ponto lá estava junto com o moto táxi na porteira
da fazenda. Faço uma observação pouco modesta: a fazenda Havana não costuma
abrir o alambique às segundas feiras sobretudo após o festival por conta do
volume de visitas que recebem. Realmente abriram uma exceção para mim. Foi assim que me senti um honrado privilegiado!
Alguns pés de
café na entrada do terreno, algum gado e chegamos à sede da fazenda Havana.
Sou recebido por Geraldo Santiago e logo depois por Cléber Santiago. Ambos como guias "arrebentam". Geraldo, à época, residia em Porto Seguro e sempre volta a Salinas principalmente na oportunidade do festival. Conta a história da família, a quantidade de irmãos e sobretudo brilha os olhos quando fala de seu Pai, o Sr.Anísio Santiago.
Construção simples e preservada na fazenda Havana- Salinas-MG |
Sou recebido por Geraldo Santiago e logo depois por Cléber Santiago. Ambos como guias "arrebentam". Geraldo, à época, residia em Porto Seguro e sempre volta a Salinas principalmente na oportunidade do festival. Conta a história da família, a quantidade de irmãos e sobretudo brilha os olhos quando fala de seu Pai, o Sr.Anísio Santiago.
Para saber um
pouco mais da história do homem simples e produtor de cachaça Anísio Santiago recomendo
a leitura do livro O Mito da Cachaça
Havana- Anísio Santiago escrito por Roberto Carlos Santiago (Edições
Cuatiara- 2006).
O pioneirismo de
Sr Anísio Santiago é percebido de diferentes maneiras. Um exemplo disto é que
enquanto a luz elétrica só chega à Salinas em 1972 através de gerador à diesel
a fazenda Havana já tinha luz desde 1960 com uma pequena usina no sistema Roda
Peltron. A fazenda produzia o próprio café, o próprio açúcar, tinha sua
autonomia de roça e gado ou seja, auto-suficiente e sustentável muito antes dessas palavras serem recorrentes nos
dias atuais.
Sr.Anísio é o primeiro produtor de cachaça de Salinas a envelhecer cachaça em tonéis de Bálsamo e rotular seu produto. Para a época isto significou uma forma de seus consumidores identificarem sua produção principalmente em Montes Claros, cidade vizinha e grande pólo de comércio e distribuição de sua cachaça. Para o produtor uma forma de agregar valor. O mais importante: sem ambição, já que segundo relatos, Sr Anísio não colocava o lucro como uma prioridade.
Sr.Anísio é o primeiro produtor de cachaça de Salinas a envelhecer cachaça em tonéis de Bálsamo e rotular seu produto. Para a época isto significou uma forma de seus consumidores identificarem sua produção principalmente em Montes Claros, cidade vizinha e grande pólo de comércio e distribuição de sua cachaça. Para o produtor uma forma de agregar valor. O mais importante: sem ambição, já que segundo relatos, Sr Anísio não colocava o lucro como uma prioridade.
Bancada de madeira maciça |
Geraldo Santiago
me mostra a bancada onde o Sr Anísio também trabalhava como marceneiro e pelas
invencionices é possível perceber seu cuidado por manter tudo funcionando, tudo
“tinindo”, prova disto é o Chevrolet
Lead Master 1947 muito conservado e como diz o povo "rodando mais que notícia ruim".
Acervo da Fazenda Havana |
Se mudar têm um preço, qual o preço de não mudar?
O antigo apontando o para o presente, o novo voltado ao passado |
Muitas pessoas
me perguntam se a cachaça Havana/Anísio Santiago tem justificativa para custar
o que custa já que chega por São Paulo e Rio de janeiro beirando os
quatrocentos reais. Então vamos lá:
Copo Furado e Anísio Santiago: história social da cachaça |
Primeiramente é
importante salientar que a cachaça é produzida pela família Santiago com o
cuidado de manter todas as características de produção do período em que Sr
Anísio Santiago estava à frente. Neste sentido lembro do amigo Nando Chaves da
cachaça Séc.XVIII de Cel. Xavier Chaves- MG. Nando costuma dizer: “...Thiago
eu não posso fazer a cachaça do jeito que quero, eu preciso fazer uma cachaça
respeitando a tradição do que se fazia no século XVIII...”. Este também é o
cuidado da família Santiago: respeitar o legado construído pelo patriarca.
A propósito, engenhos
e alambiques com a história da fazenda Havana nos remetem à discussão sobre a
adequação destes patrimônios históricos à legislação vigente para a
produção de cachaça pois nem sempre as
exigências do MAPA(Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento)
consideram o elemento histórico no que se refere à estrutura arquitetônica da
unidade produtora. Com isso muitos produtores de cachaça de fazendas e engenhos
históricos acabam tendo um gasto maior em manter a estrutura histórica e
adaptá-la às novas exigências do que se construíssem uma unidade produtora
completamente nova. Engenhos com alambiques como
Havana, Séc. XVIII, Colombina(fazenda do Canjica), Barra Grande (SP) são experientes nesse assunto que merece bastante carinho.
O canavial ainda preserva a cana Java do tempo de Sr Anísio. A fermentação continua sendo feita à base de milho produzido na
própria fazenda. A destilação em equipamento de cobre ainda é feita em um destilador
do tipo “Tromba de elefante” sem
serpentina, com alonga e sem deflegmador.
Estes são elementos que vão interferir diretamente não apenas no sabor do produto mas também no rendimento de cada destilação.
Este rendimento tende a ser menor comparado com os equipamentos de modelos mais recentes. A condensação é feita através da água que resfria o Capelo ou Capitel, parte superior após a coluna do alambique, que é bem pequena! A panela do alambique é aquecida por fogo direto.
Há que se lembrar que no copo a Havana/ Anísio Santiago do alto dos seus 44,8° Gl ostenta um vivo colar de persistência incomum nos dias atuais onde os produtores têm preferido teores alcoólicos menores e mais "acessíveis" ao grande público. Eis a análise sensorial poética de minha autoria:
Havana/ Anísio Santiago
No braço uma garrafa
Um sabor na memória
Pungente e autêntica
Floral agreste é sua história
É quente, quase nordeste
Especiarias, erva-doce
E como se manjericão fosse
Norte-sul, leste- oeste
Borbulha um colar de arte
É num beijo assim a minha parte
Sol mais forte que o daqui
Um calor indefinível
Sabor bom imprevisível
Desses feito o do pequi
Anis de Anísio
Santiago ficou perto de Havana
Pra quem gosta de cachaça
Essa é mais que u'ma garrafa
É alcançar uma graça
Abraço forte de quem se ama
Thiago Pires
Salvo as falsificações, nunca escutei de alguém que a Havana/ Anísio Santiago estivesse fora de padrão, o que é sinal de uma ótima padronização, atributo das melhores marcas.
Moenda modelo "trapiche" acervo da fazenda Havana |
Estes são elementos que vão interferir diretamente não apenas no sabor do produto mas também no rendimento de cada destilação.
Este rendimento tende a ser menor comparado com os equipamentos de modelos mais recentes. A condensação é feita através da água que resfria o Capelo ou Capitel, parte superior após a coluna do alambique, que é bem pequena! A panela do alambique é aquecida por fogo direto.
Há que se lembrar que no copo a Havana/ Anísio Santiago do alto dos seus 44,8° Gl ostenta um vivo colar de persistência incomum nos dias atuais onde os produtores têm preferido teores alcoólicos menores e mais "acessíveis" ao grande público. Eis a análise sensorial poética de minha autoria:
Havana/ Anísio Santiago
No braço uma garrafa
Um sabor na memória
Pungente e autêntica
Floral agreste é sua história
É quente, quase nordeste
Especiarias, erva-doce
E como se manjericão fosse
Norte-sul, leste- oeste
Borbulha um colar de arte
É num beijo assim a minha parte
Sol mais forte que o daqui
Um calor indefinível
Sabor bom imprevisível
Desses feito o do pequi
Anis de Anísio
Santiago ficou perto de Havana
Pra quem gosta de cachaça
Essa é mais que u'ma garrafa
É alcançar uma graça
Abraço forte de quem se ama
Thiago Pires
Salvo as falsificações, nunca escutei de alguém que a Havana/ Anísio Santiago estivesse fora de padrão, o que é sinal de uma ótima padronização, atributo das melhores marcas.
A simplicidade do "Tromba de Elefante" |
Estas já seriam
algumas especificidades que confeririam à Havana/Anísio Santiago elementos de
exclusividade mas não pára por aí. No quesito envelhecimento Cléber Santiago
nos conta que a Havana possui um padrão conferido por seus tonéis antigos de
bálsamo de Salinas. Recentemente adquiriram novos tonéis mas para se ter um
ideia estes tonéis só vão ser utilizados praticamente daqui a oito anos já que como
dornas novas ainda vão demorar um tempo para entrar no padrão das outras dornas
usadas para a Havana/Anísio Santiago.
Outro elemento que confere um diferencial é que segundo Geraldo Santiago, desde que seu Anísio estava à frente da fazenda Havana sempre teve por hábito remunerar seus trabalhadores acima da média e têm procurado manter este histórico. Devemos lembrar que a cachaça Havana/ Anísio Santiago possui selo de indicação geográfica e certificação de orgânico. Sendo assim independente de você gostar de bálsamo ou não, de achar a embalagem muito simples ou qualquer outra coisa, é preciso considerar o conjunto da obra, o estado de arte.
Estes seriam
elementos materiais que poderiam justificar um preço acima da média em se
tratando de uma cachaça envelhecida por oito anos em bálsamo. Há que se
considerar os intangíveis, os elementos que agregaram valor à marca por conta
de sua história e do protagonismo de seu produtor. Há que se considerar que a
família optou por manter viva a história e que isto possui um custo mínimo.
Salinas e sua icônica madeira de Bálsamo |
Outro elemento que confere um diferencial é que segundo Geraldo Santiago, desde que seu Anísio estava à frente da fazenda Havana sempre teve por hábito remunerar seus trabalhadores acima da média e têm procurado manter este histórico. Devemos lembrar que a cachaça Havana/ Anísio Santiago possui selo de indicação geográfica e certificação de orgânico. Sendo assim independente de você gostar de bálsamo ou não, de achar a embalagem muito simples ou qualquer outra coisa, é preciso considerar o conjunto da obra, o estado de arte.
Sala de fermentação impecável |
Paróis. Acervo da Fazenda Havana |
Geraldo aponta como a concorrência de hoje em dia é um elemento com o qual não consideravam há vinte anos atrás. Agora em 2019 Salinas possui outras cachaças com história e têm procurado do seu modo apresentar outros ícones. Há cinquenta anos atrás cachaça de Salinas era sinônimo de Havana. Isto não significa que a cachaça perdeu valor, pelo contrário, para manter sua forma de produção intacta, entendeu que mais valioso que seu sabor, que em si já é algo que merece alguns comentários, é sua trajetória, sua família, sua história e a relação com seus clientes.
A Havana/ Anísio
Santiago talvez seja a marca de bebida brasileira mais falsificada em mercados
sem procedência. Isto também cobra dos produtores buscar formas de garantir a
autenticidade do produto, seja na questão do líquido, seja na questão do
rótulo. Fato é que a marca é um ícone e
ícones são construídos pelo tempo e pela autenticidade.
Depois de um bom
papo, de adquirir minhas garrafas digo que sou curioso quanto à matriz da
Havana/ Anísio Santiago, ou seja a versão branca, sem amadeiramento. De pronto
Cléber me pergunta se tenho uma garrafa. Não! Eles conseguem uma long neck de
275 ml e a enchem com uma matriz branca. Essa não é a Havana, essa é não é a
Anísio Santiago. Essa é a matriz da Havana. A matriz da Anísio Santiago. Esse
produto não existe no mercado. Mais uma vez me sinto um privilegiado,
presenteado por aquela jóia e tenho certeza que a confiança e o acolhimento da
família já seriam um grande presente. O sensorial deste líquido deixo guardado
com os amigos com que fiz questão de compartilhar.
Um abraço forte como cachaça!
Um abraço forte como cachaça!
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